Pesquisa interdisciplinar apoiada pela FAPDF busca alternativas às limitações das tecnologias de IA e destaca a importância da colaboração humana
As humanidades digitais estão no centro do debate sobre o uso da Inteligência Artificial, um estudo feito na UnB apoiado pela FAPDF propõe soluções. (Créditos: Divulgação/IA).
As redes sociais foram tomadas nos últimos dias por versões em animação de fotografias pessoais, onde usuários puderam ver e compartilhar como seriam caso fossem personagens do Studio Ghibli, um estúdio de animação japonês fundado em 1985. A funcionalidade foi disponibilizada gratuitamente pelo Chat GPT, uma ferramenta desenvolvida pela Open AI, uma empresa e laboratório de pesquisa para Inteligência Artificial situada nos Estados Unidos.
A Inteligência Artificial (IA) tem se consolidado como uma das tecnologias mais impactantes da atualidade, mas também gera debates sobre seus desafios e limitações. Em meio a esse cenário, um projeto da Universidade de Brasília (UnB) está propondo uma abordagem inovadora para repensar a IA e explorar alternativas baseadas na interpretação humana e na colaboração.
Inteligência Artificial: desafios e limites
O estudo é um desdobramento de um projeto interdisciplinar iniciado após a pandemia, em parceria com pesquisadores da Universidade de Tecnologia de Troyes, na França. A pesquisa se baseia na análise das tecnologias de tradução, área que historicamente impulsionou o desenvolvimento da IA.
Desde 2006, os pesquisadores envolvidos no projeto trabalham na ferramenta TraduXio, um sistema digital colaborativo que propõe um modelo alternativo às soluções tradicionais baseadas em cálculo e previsão. “Nosso objetivo é demonstrar que a noção de conjectura pode ser entendida não como simples cálculo do provável, mas como uma interpretação refinada do plausível”, explica um dos coordenadores do estudo, Philippe Claude.
A pesquisa ‘IA: Desafios e Limites’ é uma colaboração entre Universidade de Brasília (UnB) e Universidade Troyes, da França, com apoio da FAPDF. (Créditos: Divulgação/IA)
Desafios éticos e soluções alternativas
O projeto também se debruça sobre questões éticas e legais associadas ao uso da IA, incluindo vieses algorítmicos e questões de propriedade intelectual. De acordo com os pesquisadores, as tecnologias tradicionais frequentemente ignoram questões como direitos autorais e tornam invisível o trabalho humano. Um exemplo disso foi observado no episódio envolvendo o uso das imagens do Estúdio Ghibli, em que um dos co-fundadores do estúdio, Hayao Miyazaki, declarou que seria um “insulto à própria vida”, uma animação feita com inteligência artificial.
A proposta do projeto é, portanto, sensibilizar formuladores de políticas e a comunidade científica sobre a existência de alternativas tecnológicas que priorizam a colaboração humana. “Tecnologia não precisa significar apenas automatização. Podemos desenvolver ferramentas que auxiliam na interpretação e na tomada de decisão, fortalecendo a inteligência coletiva”, destacou Philippe.
Direitos Autorais e Redes Sociais
Sobre a questão envolvendo direitos autorais e o Estúdio Ghibli, Philippe acredita que é um dos casos em que há violação. “É preciso diferenciar várias coisas, como: Na constituição e formação da IA, os algoritmos são treinados sobre o Web comum (se chama “common crawl”). Mas por ser comum, no sentido de comumente acessível, não é necessariamente do domínio público. Por exemplo, Wikipedia é utilizada, mas a enciclopédia é protegida por uma licença. Os produtos derivados são autorizados, na condição de utilizar a mesma licença”, explica o especialista.
No caso observado, com a viralização das ilustrações, Philippe reforça a necessidade de impor restrições legais. “Quando uma IA utiliza esses dados para treinar, ela faz uma obra derivada, mas não respeita a licença. De maneira geral, as IA não respeitam os direitos autorais: daí o risco para várias profissões como dublagem, tradução, entre outras”, avaliou.
O recente caso de uso sem autorização nem direitos autorais viralizado na internet trouxe à tona os riscos para o trabalho humano envolvendo a tecnologia da Inteligência Artificial. (Créditos: Divulgação/IA)
Colaboração internacional e impacto social
Com fomento da Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF), o estudo envolve uma ampla colaboração entre estudantes da Universidade de Brasília (UnB) e da Universidade de Troyes, na França. Os pesquisadores franceses desenvolvem novas funcionalidades para a ferramenta TraduXio, enquanto o grupo brasileiro testa e avalia sua aplicabilidade.
Desde 2006 a equipe trabalha no TraduXio, uma plataforma de tradução colaborativa que prioriza a inteligência coletiva como alternativa a modelos tradicionais focados em cálculo e previsão. (Créditos: Arquivo/TraduXio)
A tecnologia, baseada na plataforma Hyperglosae, promove a assistência à avaliação e à decisão, distanciando-se da ideia de que a IA deva necessariamente operar por meio de previsão e automatização. Caso os testes confirmem sua viabilidade para uso cotidiano, o projeto será considerado um sucesso.
Com um olhar para o futuro, os pesquisadores esperam que os resultados da pesquisa possam influenciar a regulação da IA e inspirar novas abordagens tecnológicas em diversas áreas. “O que estamos propondo não é apenas uma reflexão teórica, mas uma tecnologia concreta que pode beneficiar as ciências humanas e sociais, trazendo um modelo mais colaborativo e inclusivo para a era digital”, conclui um dos membros do projeto.
O estudo está em fase de teste e alguns exemplares de tradução foram testados, a exemplo na imagem: a bíblia sagrada. (Créditos: Arquivo/TraduXio)
Para o presidente da FAPDF, Marco Antônio Costa Júnior, o apoio a esta pesquisa por meio do edital Demanda Espontânea (2023), reforça o compromisso da FAPDF com a inovação e com o desenvolvimento de tecnologias que colocam o ser humano no centro das soluções. “A inteligência artificial tem um enorme potencial, mas seu uso precisa ser constantemente avaliado à luz de seus impactos sociais, éticos e culturais. Esse projeto representa um passo importante na construção de abordagens mais colaborativas e inclusivas para o futuro da IA”, conclui Marco Antônio.
Reportagem: Natasha Oliveira
Edição: Mariah Brandt
Imagens: Divulgação/Studio Ghibli
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